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Célia Rodrigues interessou-se pela psiquiatria pela possibilidade de unir medicina e antropologia

Célia Elisabete Rodrigues | Psiquiatra

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A psiquiatra Célia Elisabete Rodrigues acredita que o profissional dessa área deva ser, antes de tudo, compassivo. "É preciso que ele entenda a dor do paciente e seja capaz de ajudá-lo a construir um sentido para essa dor", diz. Uma tarefa que será cada vez mais requerida numa sociedade que, como conceitua Célia, "é uma fábrica de dor". Formada pela Universidade Federal Fluminense em 1985, Célia fez especialização strictu sensu em 1986 no Instituto de Psiquiatria da Universidade Federal do Rio de Janeiro e foi residente no Hospital Pinel em 1987 e 1988.

A experiência de dez anos em instituições psiquiátricas — atualmente ela atende em consultórios — lhe deu uma visão de como funciona o sistema manicomial brasileiro. Por isso, ela é a favor da lei aprovada no Congresso Nacional do deputado federal Paulo Delgado, que propõe o fim das internações psiquiátricas. Célia faz, no entanto, uma ressalva: "é necessário criar alternativas para que não se reproduza o que ocorreu em Trieste, na Itália. Com o fim do atendimento em manicômios, muitos pacientes viraram mendigos."

Quando você decidiu optar pela especialização em Psiquiatria?

Quando estava cursando o Segundo Grau (hoje Ensino Médio), fiquei em dúvida se faria Ciências Sociais ou Medicina. Acabei escolhendo Medicina. Na hora de buscar uma especialização, optei por Psiquiatria porque nesta área teria a possibilidade de associar a Medicina e a Antropologia.

Sempre tive fascínio por Medicina, por cuidar das pessoas, ser solidária. Ao mesmo tempo, a questão social sempre foi muito importante para mim. Mas, nunca encontrei em partidos algo que realmente me satisfizesse. Já Antropologia é uma espécie de psiquiatria do coletivo.

Como é o seu trabalho atual? Você atende em hospitais ou num consultório particular?

Sinto-me útil na minha profissão. É um trabalho ao mesmo tempo prazeroso e interessante. Atualmente, atendo em um consultório em Niterói, mas trabalhei por dez anos em instituições psiquiátricas. Parei porque é muito sofrimento, tanto de quem está internado quanto de quem atende o paciente. Mas, acho que todo psiquiatra tem que ter essa experiência de trabalhar num hospital. Nessas instituições vemos casos extremos, lidamos muito com esquizofrênicos. No consultório, trato mais pessoas de classe média, uma faixa social onde há maior incidência de depressão. De vez em quando aparece um esquizofrênico.

Há uma distribuição das doenças de acordo com as classes sociais?

Claro que há depressão e esquizofrenia em todas as classes sociais. Há um componente genérico que não pode ser ignorado. Por outro lado, existem condições que fazem com que uma predisposição venha a aflorar. A esquizofrenia, por exemplo, é mais comum nas classes economicamente menos favorecidas. Quase todos os mendigos são esquizofrênicos. Eles dificilmente criam um vínculo com você. Na minha opinião, a miséria material de algumas pessoas é tão grande que leva à miséria moral.

Quais são os maiores desafios para a Psiquiatria hoje?

O desafio da Psiquiatria está na compreensão da fala do paciente para que ele possa construir um sentido para sua dor. Hoje eu entendo que essa dor procede, principalmente, da solidão, da falta de qualidade de vida. A trama do afeto está se esgarçando na nossa sociedade.

O Psiquiatria deve estudar psicanálise? Quais as relações entre a psiquiatria e a psicanálise?

Não necessariamente, embora eu tenha estudado Psicanálise. A Psiquiatria é uma especialidade médica recente se comparada a outras especialidades, e a Psicanálise é uma corrente filosófica que pode funcionar como um instrumento terapêutico. Seria um casamento entre ciência e filosofia, aumentando as possibilidades de compreensão do paciente.

Você trabalha em conjunto com psicanalistas?

Não necessariamente. Eu sou uma psiquiatra clínica que usa a psicanálise como uma ferramenta. Acho que temos tão poucos recursos para lidar com a dor que não dá para se fechar numa posição ortodoxa. Quando é necessário, receito remédios. O preconceito dos psicanalistas contra o remédio ocorre porque eles reduzem tudo a uma questão filosófica. Também existe química no nosso cérebro.

O que você acha do projeto de lei antimanicomial do deputado federal Paulo Delgado, aprovado pelo Congresso Nacional?

Penso que é ótimo, desde que se crie infraestrutura para que não aconteça conosco o que houve em Trieste, no Movimento do Basaglia (movimento antimanicomial surgido nos anos 70), onde os doentes saíram do hospício para a mendicância.

Como está hoje o mercado de trabalho para um jovem que acaba de se formar em Medicina com especialização em Psiquiatria?

Eu diria que é bom e tende a melhorar porque a sociedade urbana é uma fábrica de dor.

Qual o conselho que você daria para um jovem que pensa em estudar Psiquiatria?

Seja compassivo. Porque você vai trabalhar com a dor do outro.



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