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A história e o trabalho em educação em museus

Beatriz Muniz | Historiadora

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No início dos anos 80, Beatriz Muniz Freire estava terminando a faculdade de História na Universidade Federal Fluminense (UFF) quando surgiu a oportunidade de trabalhar como guia bilíngüe no Museu do Índio. O interesse por Cultura Popular já havia surgido na própria faculdade, quando ela teve aulas sobre Antropologia. Trabalhar num museu etnográfico seria, portanto, um desafio e uma oportunidade para ter mais contato com o folclore e as manifestações populares.

No dia-a-dia, porém, ela percebeu que as crianças e os professores visitavam o museu, mas tinham uma idéia equivocada sobre os índios. "Havia criança que não queria entrar porque tinha medo de encontrar um índio". Beatriz começou então a questionar se as informações passadas por um guia numa visita ao museu seriam capazes de mudar uma visão que havia sido impingida aos estudantes durante meses pelos professores.

A solução seria aproximar o museu das escolas, uma idéia relativamente nova no Brasil nos anos 80. Beatriz fez mestrado em Educação na PUC-RJ justamente para estudar este tema. Hoje, ela coordena o setor de Ação Educativa do Museu do Folclore Edison Carneiro, no bairro do Catete, no Rio de Janeiro. O museu pertence ao Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular, órgão do Ministério da Cultura, e tem como objetivo pesquisar, documentar e difundir a cultura popular brasileira contemporânea.

Qual a sua formação e como surgiu o seu interesse pela cultura popular?

Meu interesse em cultura popular surgiu quando cursava a graduação em História. O currículo previa um ano de estudo de Antropologia. Gostei tanto que acabei cursando todas as eletivas oferecidas, uma delas orientada pelo antropólogo Rubem Cesar Fernandes. Estudamos religiosidade popular e minha visão sobre o tema mudou muito. Eu já tinha forte vontade de compreender a sociedade brasileira e preocupação com as chamadas questões sociais, principalmente com a desigualdade, mas estava acostumada a refletir considerando apenas os aspectos econômicos e políticos. Estudando História e Antropologia descobri a dimensão cultural de todo gesto humano e me surpreendi com a diversidade de pontos de vista e de modos de vida que coexistem em nossa sociedade.


Como foi a sua entrada no mercado de trabalho?

Como muitos colegas de graduação, levei algum tempo para decidir como me profissionalizar, como fazer do interesse pelo conhecimento um meio de 'ganhar a vida'. Fiz estágio num centro de pesquisa em História Contemporânea, o CPDOC (Centro de Pesquisa e Documentação) na Fundação Getúlio Vargas. Também dei aulas particulares. Mais tarde, me empreguei no Museu do Índio, como guia bilíngue, já que havia estudado francês por cinco anos. Um dos objetivos do Museu do Índio era combater os preconceitos contra os povos indígenas. Atendíamos principalmente ao público escolar. Fiz muitas leituras interessantes (o museu tem uma excelente biblioteca) e logo me dei conta de que a visita ao museu não era bastante para alterar a visão geralmente negativa que os estudantes (e por vezes os próprios professores) tinham dos povos indígenas. Muitos livros didáticos e meios de comunicação de massa divulgavam informações erradas e tendenciosas. Passávamos a maior parte da visita negando essas informações.

Ainda é assim atualmente? A visão que as pessoas tinham dos índios mudou nesses últimos anos?

Muito e em parte devido à organização dos próprios povos indígenas. Durante a elaboração da Constituição de 1988, os índios souberam se impor e lutar pelos seus direitos. Isso lhes deu muita visibilidade na mídia e fez com que as pessoas começassem a mudar suas visões sobre os indígenas. Nessa época, resolvemos mudar a forma de atendimento e passamos a oferecer programas criados a partir dos temas tratados na exposição do museu, aliando conversa e atividades lúdicas para crianças e jovens. Foi uma época de muita criação, muitas experiências educativas, sempre tomando os acervos do museu (objetos, fotografias, filmes) como referência. Foi assim que descobri a Educação em Museus, um campo relativamente novo no Brasil, que teve início no Museu Nacional do RJ, nos anos 30.

Foi então que a sra. começou a se aproximar da área educacional?

A necessidade de estudar para explorar melhor as possibilidades educativas do museu me levou a fazer mestrado em Educação, na PUC do RJ. Minha pesquisa foi sobre a relação museu/escola e fui orientada pela antropóloga Tânia Dauster. Escolhi como local de observação (a metodologia antropológica de pesquisa pressupõe que o pesquisador faça observação direta do fenômeno estudado) o Museu de Folclore Edison Carneiro (MFEC), onde passei a trabalhar em 1992.

Como é o seu trabalho no museu?

Coordeno o setor de Ação Educativa, elaborando programas de atendimento ao público e projetos educativos. Tentamos divulgar os estudos sobre cultura popular brasileira contemporânea nas escolas. Não se pode ver o folclore apenas como algo do passado. Ele está nas ruas, no dia-a-dia das pessoas. O Museu do Folclore Edison Carneiro trata da cultura popular que está viva e se transforma, é dinâmica.

Você está desenvolvendo alguma pesquisa?

Estou pesquisando a história da formação desse campo de estudos que chamamos de folclore ou de cultura popular. Tenho um interesse particular pela ação educativa desenvolvida pela Campanha de Defesa do Folclore Brasileiro, que foi um órgão do governo federal muito atuante nos anos 60 e 70. Foi por influência dos folcloristas que atuavam na Campanha que o folclore passou a ser estudado nas escolas. Parte da documentação hoje reunida no Museu de Folclore Edison Carneiro foi produzida pela Campanha, que na verdade é a instituição que deu origem ao Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular. A visão que hoje temos da cultura popular se diferencia muito daquela defendida pela Campanha que, no entanto, permanece viva na escola.

Como você vê o futuro da educação em Museu?

Trabalhar com educação em museu é um constante desafio, pois tanto a teoria quanto as metodologias de atuação estão sendo criadas em serviço. Nós, profissionais de museus, é que estamos inventando diferentes modos de explorar o potencial educativo dessa instituição tão peculiar, verdadeira casa dos objetos do homem.



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