Obras poéticas:
A Orgia dos Duendes
Canto da Solidão
Inspirações da Tarde
A Origem do Mênstruo
O Elixir do Pajé
O Bandido do Rio das Mortes (póstuma - 1905)
Novas poesias (1858)
Poemas polêmicos (1875)
Disparates Rimados
O devanear de um Céptico
Humorísticos e irônicos de Bernardo Guimarães
Cantos da solidão, 1852
Inspirações da tarde, 1858
Poesias diversas, 1865,
Evocações, 1865
POESIAS, 1865: volume com 4 obras em verso anteriores publicadas + poema A baía de Botafogo.
CONTOS
Lendas e romances, 1871
O pão de ouro, 1879
Jupira
Dança dos Ossos
CRÔNICAS e NOVELAS
Histórias e tradições de Minas Gerais, encomendada pelo imperador D. Pedro II: contos/novelas, 1872 - A filha do fazendeiro
ROMANCES
O ermitão de Muquém, escrito em folhetim 1858; publicado em 69
O garimpeiro, 1872
O seminarista, romance de tese, 1872
O índio Afonso, 1872
O índio Afonso, 1873
A escrava Isaura, 1875
Maurício ou Os Paulistas em São João Del-Rei, 1877
A ilha maldita ou A filha das ondas, 1879
Rosaura, a enjeitada, 1883
Obras póstumas
O bandido do Rio das Mortes, 1905, romance, concluído por sua esposa Teresa Guimarães
DRAMA
A voz do pajé, 1860
Outros dramas não publicados em vida
Os inconfidentes, 1865
Os dois recrutas, 1870
As nereidas de Vila Rica ou as fadas da liberdade, 1870
A catita Isaura, 1876
Escrito em plena campanha abolicionista: primeiros anos do reinado do senhor Dom Pedro II. Numa fazenda em Campos de Goitacazes, à margem do Paraíba, norte do Rio de Janeiro, vivia Isaura; era escrava de beleza singular. Por quê? Fruto da união de um feitor português, Miguel, com uma escrava mulata, Juliana, mucama favorita e criada fiel da esposa do comendador. Miserando destino de Juliana: atormentada pelo proprietário da bela e suntuosa fazenda, comendador Almeida, pai de Leôncio, até a morte.
Isaura nasceu, de fato, antes que a Lei do Ventre Livre assegurasse a liberdade a todas as crianças nascidas de ventre escravo. Desse modo, a cor da pele pouco importava, uma vez que sua origem selava o seu infortunado destino.
Isaura mestiça, mas com destaque de suas características do pai [fruto do autor], teve educação esmerada por sorte de sua sinhá, que lhe dera os primeiros ensinamentos, além de complementar com estudos de piano, canto e línguas estrangeiras.
Leôncio e Malvina: casamento por especulação. Malvina era filha de riquíssimo negociante da corte e amigo do comendador
A situação na fazenda era insustentável: Leôncio e Henrique, irmão de Malvina, tentavam, em vão, seduzi-la. Por repelir o senhor, a escrava foi punida com sua ida para a senzala e ameaçada de ir para o tronco. Seu pai lhe propõe fuga para qualquer lugar bem longe dali. Seguiram para as províncias do Norte em um navio negreiro de que era capitão um também português, antigo e dedicado amigo de seu pai. Chegam ao Recife já com nomes falsos: ela com o nome de Elvira; ele, Anselmo.
É claro que com tamanha beleza, logo se destacará nos salões. É observada por Álvaro, jovem rico, abolicionista e republicano. Da célere relação, surge o amor. Leôncio a reencontra e a conduz à fazenda; ainda era sua escrava. Não lhe fora concedido o título, que seu pai tentara adquirir após anos de economia e sofrimento para juntar os dez contos de réis da liberdade. Como penalidade pela fuga, o algoz lhe propõe casamento com o jardineiro da fazenda, Belchior, apesar de sua deformidade e idiotismo.
Entretanto, quando lhe escapam as forças, Álvaro traz a salvação: Leôncio em péssimas condições financeiras; bens nas mãos de vários credores. Álvaro compra/negocia suas dívidas. A partir de agora seu único credor. Decreta a sua falência/insolvência. Sem saída, Leôncio suicida-se. O amor triunfa enfim; casam-se.
A justiça é uma deusa muito volúvel e fértil em patranhas. [cap. XV]
Romantismo – segunda geração – regionalismo romântico
Recursos expressivos
= narrativa pormenorizada; rica em detalhes que retratam a intensidade dos costumes e da vida social [abuso de adjetivos redundantes, segundo o crítico Antonio Candido]
= descrição da impressionante paisagem brasileira: a pintura exata, viva e bem traçada dos lugares – as fazendas, o canto das aves, a cor da vegetação tão única em nosso país, a luz do sol fustigando a terra.
= um sertanismo com toque de lirismo = sertanismo romântico [Massaud Moisés]
= subjetivismo: o mundo pessoal, interior, se torna palco para a criação repleta de emoções pessoais
= linguagem mais espontâneana produção dos romances
= nosso autor propõe um retorno à forma dos clássicos portugueses, com exclusão da mitologia grega, para, desta forma, pintar a época em que vivia com trejeitos de fidedignidade.
= Romantismo marcado pela fé: crença na própria verdade, na justiça procurada, nos sentimentos revelados, nos ideais perseguidos.
= carregada de emoções e sentimentos, nas figuras do herói e do vilão, na visão de mundo maniqueísta.
= figura da mulher idealizada
= o amor à primeira vista: Isaura + Álvaro
= nosso autor busca sensibilizar seus leitores do problema escravagista – “transfere” o leitor para a pele de uma escrava. Seu público deveria se identificar com a cativa Isaura, perceber seu sofrimento e questionar sobre a injustiça da escravidão.
Linguagem
Leôncio: um perfeito dândi
gíria da época; ref. aos homens com grande fama de conquistadores.
jornaleiro: peão de fazenda, que trabalhava por jornada.
Agentes particulares: caçadores de escravos; homens livres que, em troca de dinheiros, perseguiam escravos fugidos para devolvê-los ao dono. Ex. Martinho [cap. XIII, XIV, XVI]
Que me queres?.. = Que queres de mim? [cap. VI]
Admirá-la mais de espaço = mais devagar [cap. X]
Caluda! Interjeição usada para pedir silêncio [VI]
Máximas / adágios populares:
“... atrás de mim virá quem bom me fará”
“enquanto o pai vai e vem, folgam as costas” [ cap. XVI]
era cré com cré, lé com lé [cap. XIX]
= cada qual com o seu igual
estudantes: excêntricos à Byron [cap. XIII]
poeta inglês, cuja vida aventureira influenciou o comportamento de jovens de muitos países no século XIX.
Misantropos, cheios de esplim [do ingl. spleen]= tédio de tudo, enfado, melancolia
Martinho nada tem de esplinético nem de byroniano.
Constantes ref. à Mitologia Greco-romana
Isaura
- cantora como Vênus, deusa do amor, nascida das espumas do mar. [cap. I]
- ao piano, uma Calíope, a musa da poesia épica e da eloqüência [cap. XI]
Ref. a Johann Lavater, filósofo suíço que pretender descrever as características morais das pessoas de acordo com seus traços fisionômicos [cap. XIII]
Ref. a Abraão – personagem bíblico - que amou sua escrava, serva egípcia Agar, e por ela abandonou Sara, sua mulher. [cap. XV]
Isaura petrificada como a mulher de Ló
De acordo com a Bíblia, a esposa de Ló foi transformada em estátua de sal, porque olhou para trás, ao fugir da cidade de Sodoma. [cap. XX]
Leôncio è Álvaro
Esse D. Quixote de nova espécie, amparo da liberdade das escravas alheias, não achará senão moinhos de vento a combater. [cap. XXI]
Linguagem Conotativa – recurso especial de construção; valoriza e embeleza o texto:
COMPARAÇÃO
A tez é como marfim do teclado... [cap. I]
Isso mesmo! Isaura possui aparência apolínea.
Isaura... esconder-se entre os laranjais como lebre medrosa [cap. V]
Isaura grandes olhos pretos cobertos de luz baça e melancólica eram como círios funéreos sob a arcada sombria de uma capela tumular. [cap. XX]
METONÍMIA
Leôncio pôs-se a fumar tranquilamente o seu havana. [o lugar de produção pelo produto] cap. V
HIPÉRBOLE
... fuzilaram-lhe nos olhos lampejos de cólera terrível. [cap. VI]
... atirou-se ao seio de seu pai e inundou-o de uma torrente de lágrimas [cap. XX]
PERÍFRASE
Recife, Veneza da América do Sul [cap. X]
Leôncio: coração ardendo nas chamas de uma paixão febril e delirante [cap. IX]
Personagens: planos, estáticos, superficiais,
estereótipos, de uma coerência rígida, sem mistura, defeitos ou virtudes
Heroína: Isaura, escrava submetida às vontades de seu senhor; resiste ao assédio, conserva sua dignidade e pureza.
Miguel, seu pai: jardineiro de profissão; passou a vida como feitor num círculo limitado de relações
Malvina + Leôncio
Malvina, moça ingênua e crédula, com um coração sempre propenso à ternura e ao perdão; esposa ofendida
Comendador Almeida: sinhô velho, “home judeu” = avarento, mau. Morte no cap. VII / VIII / IX
Vilão: Leôncio, filho, um dos mais afamados e elegantes leões dos bulevares
leões = homens com fama de grandes conquistadores
Reafirmação dos direitos do proprietário de escravos sobre o ser humano reificado que deve ceder, de forma submissa, aos seus caprichos e vontades.
Seu amor é doentio; coexiste com o ódio.
Herói: Álvaro – ideias abolicionistas, espírito filantrópico; luta contra os valores da sociedade a qual pertence.
Rosa: escrava apaixonada pelo patrão, amásia dele, maligna e vingativa; êmula = rival, adversária; nutre inveja de Isaura. [cap. VII]
6 horas: escravos chamados para o jantar: vamos ao feijão
A ração alimentar do escravo de maneira geral era composto de fubá de milho cozido com água o chamado angu, feijão e sal, pirão, a caça, a pesca, a carne-seca, toucinho, farinha de mandioca, banana e laranja. A nossa famosa “feijoada”. Sabia?
OBJETOS da ESCRAVIDÃO:
Chicote de Leôncio + algemas + tronco + roda
NARRADOR
Entremos sem cerimônia
CONVERSA COM O LEITOR
Em duas palavras o leitor ficará inteirado do motivo desta malevolência de Rosa. [cap. VII]
Descrever o mísero estado em que ficou aquela pobre alma é empresa em que não me meto; os leitores que façam ideia. [cap. XVIII]
Flashback
Pelo diálogo acima o leitor bem vê que nos achamos de novo na fazenda de Leôncio,... na mesma sala em que no começo desta história encontramos Isaura entoando sua canção favorita. [cap. XIX]
Para a sociedade conservadora e racista, no Brasil
do século XIX, a cor da pele significa uma espécie
de distinção. A escrava Isaura tem a pele branca, mas a sua origem é negra, ela é então vítima de um tipo racismo que pode esclarecer a discriminação no Brasil hoje. A discriminação pela cor da pele amplia um tipo de segregação que vai além do racismo.
A escravidão e o tráfico negreiro
A escravidão no Brasil iniciou-se ainda na primeira metade do século XVI, com início das atividades de produção de açúcar.
Fonte: Biblioteca Virtual do Governo do Estado de São Paulo
As crianças não nascem escravas, no Brasil, desde 1871. A obra lida é um instrumento de denúncia da vida dos negros no cativeiro; é um panfleto das lutas em favor da abolição da escravatura no país.
Apesar de a escravidão ter se tornado oficialmente ilegal, o Estado e a sociedade não garantiram condições para os libertos poderem efetivar sua cidadania.
Fonte: Repórter Brasil – Agência de notícias
A escravidão em nosso país ainda tem um longo caminho a percorrer.
Isaura através de prismas diferentes
Adaptação para cinema, teatro e TV.
Na TV, o apelo emocional: a re-visita da obra traz, à baila, um olhar fulminante sobre as formas do preconceito e do racismo. Numa nação mestiça, as formas do racismo e da intolerância portam uma tonalidade particular, em que se misturam as formas da integração e da exclusão, em relação à estratificação social e à cor da pele.
Paródia: humor para distorcer ou criticar as ideias originais
Como uma provocação ao estilo romântico, o escritor modernista Mário de Andrade escreveu A Escrava que não era Isaura, em 1925.
A condição de escravo era comparável ao tratamento dado aos animais, pois eram vistos pela classe dominante e literatura da época como bestas de carga para a acumulação de capital. Interessava ao proprietário conservá-los, como às bestas de carga, em boas condições de uso.
CASA GRANDE & SENZALA, de Gilberto Freire, intérprete da formação do povo brasileiro, trata, em algumas passagens, do comércio e da fuga de escravos negros no Brasil.
Negros mais valorizados: os fortes e os bonitos
Jean Baptiste Debret
pintor e desenhista francês; viveu no Brasil de 1816 a 1831: aquarelas relacionadas ao trabalho escravo
Uma análise das representações românticas de mulheres brasileiras do século XIX
Assinalar as semelhanças e diferenças:
Isaura + Iracema:
Isaura elevado grau de idealização: mulher perfeita, superior e pura.
Iracema: caracterizada com base em comparações com elementos da natureza local: cabelos mais negros que a asa da graúna...
Iracema: representante índia; valorizar o índio como herói nacional; ao homem da terra é atribuído caráter perfeito e idealizado tal como Adão e Eva.
Apesar das duas idealizações...
Logo: Isaura X Iracema
Iracema: índia, que vive em liberdade e harmonia com o meio natural;
Isaura: escrava, que vive oprimida pelas injustiças do meio social.
Que atitudes podem ser tomadas para combater o preconceito e a discriminação na sociedade brasileira contemporânea? Reflitam, debatam. Concluam!
“Numa literatura não muito abundante em manifestação abolicionista, é obra de muita importância, pelo modo sentimental como focalizou o problema, atingindo principalmente o público feminino, que encontrava na literatura de ficção o caminho de fuga, numa sociedade em que a mulher só saía à rua acompanhada e em dias pré-estabelecidos; o mais do tempo ficava retida em casa, sem trabalho obrigatório, bordando, cosendo e ouvindo e falando mexericos, isto é, enredos e intrigas, como se dizia no tempo e ainda se diz neste romance.”
[crítico literário Manuel Cavalcanti Proença]
Nosso autor trouxe contribuição para o surgimento de uma literatura diversificada na temática – urbana/cortês e rural/provinciana.
Não possuindo aspirações políticas na Corte, procurou se afastar dos tons apologéticos vigentes e se aproximou de uma visão mais “neutra” e, isto é, mais distanciada de amarras conceituais. [in Bernardo Guimarães, o crítico, UFJF]
Segundo Massaud Moisés: com esse romance, Guimarães atinge o cerne do problema abolicionista e da sua obra ficcional.
Para alguns estudiosos, Bernardo acabou carregando tanto nas suas tintas que terminou por manchar seu pensamento abolicionista. A tez cor de rosa demaiada leva a crer que o interesse pela escrava estaria na sua beleza e não na sua condição. Leva-nos a pensar que se não tivesse esses dotes, provavelmente seu infortúnio não teria fim, condenada desde sempre ao pelourinho e à senzala.
“A Escrava Isaura", uma história
criada no século XIX e que ainda toca a sensibilidade do público do século XXI.